O desejo de Deus

Antes de tudo, pois, exorto que se use a prática de súplicas, orações, intercessões, ações de graças, em favor de todos os homens, em favor dos reis e de todos os que se acham investidos de autoridade, para que vivamos vida tranquila e mansa, com toda piedade e respeito. Isto é bom e aceitável diante de Deus, nosso Salvador, o qual deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade. Porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1 Tm 2.1-5).

Palavras do apóstolo Paulo a Timóteo, seu filho na fé, que estava em Éfeso, à pedido do próprio Paulo, para que permanecesse nesta cidade e na igreja advertisse certas pessoas que estavam ensinando “outra” doutrina, ou seja, heresias.

No capítulo 2 Paulo aborda a questão da oração, exortando que Timóteo ensinasse os crentes a interceder em favor de todos os homens, sem distinção, porque isso agrada a Deus. Talvez pudesse haver dúvidas se alguém merecia oração em seu favor, ou se os crentes deveriam orar em prol de sua conversão. Paulo, então, explica, que a salvação é universal, ou seja, não se limita a certo grupo particular, pois Deus “deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade”.

Como devemos entender esta questão do desejo de Deus para que todos os homens sejam salvos?

A palavra desejo, do grego “thelo”, significa querer, ter vontade, pretender, também significa ter prazer em, ter satisfação. Pelo sentido do termo, então, podemos dizer que o querer de Deus e o que lhe agrada é a salvação de todos os homens ou de todos os tipos ou classes de homens, como alguns estudiosos preferem dizer.

Mas precisamos aprofundar um pouco mais esta questão a fim de evitar alguns mal entendidos.

Todos nós cremos, com total convicção e sem razão alguma para duvidar, que Deus é perfeito em tudo e em todo o seu ser. Assim, como ser perfeitamente completo, nada lhe falta. Seria um erro, então, confundir o sentido do “desejo” de Deus, encontrado no v.4, com o que empregamos a nós mesmos quando algo nos falta e o desejamos. Por exemplo: “Estou com sede, desejo água”. Quero dizer que o desejo pela água é porque ela está faltando no meu organismo, sinalizado pela sede. O termo desejo, neste exemplo, significa querer algo que não se tem, e que falta.

Mas Deus não tem falta de nada, porque ele é perfeito e completamente pleno em tudo e em todo o seu ser. Assim, a forma correta de entender o desejo de Deus pela salvação dos homens não é no sentido de que essa salvação dos homens falta a Deus, mas no sentido de que aos homens falta a salvação e que quando eles a encontram, em Jesus Cristo, Deus, que é benevolente, se agrada com isso.

O ensino de Paulo é no sentido de que a todo ser humano falta a salvação, que só pode ser encontrada em Jesus Cristo, e que Deus conhece essa falta da salvação que todos os homens têm. Cabe à igreja, então, o dever de interceder pela conversão de todas as pessoas, de todos os tipos e classes.

O sentido estrito deste texto é sobre a universalidade da salvação e do prazer de Deus pela salvação da humanidade. Comentando este texto, Calvino diz:

“pois a intenção do apóstolo, aqui, é simplesmente dizer que nenhuma nação da terra e nenhuma classe social são excluídas da salvação, visto que Deus quer oferecer o evangelho a todos sem exceção. Visto que a pregação do evangelho traz vida, o apóstolo corretamente conclui que Deus considera a todos os homens como sendo igualmente dignos de participar da salvação (Calvino: Comentário de 2ª  Timóteo 2.4).”

Por fim, parece-nos que há pessoas extrapolando, e aplicando a expressão “desejo de Deus” de forma equivocada, trazendo confusão na mente das pessoas. Insinuam que falta algo a Deus que o crente pode preencher, como se o ser humano pudesse completar Deus em algo. Colocam Deus na posição de “torcedor”, expectador das ações humanas, totalmente passivo a elas e sem a certeza do que vai acontecer. Você pode encontrar na internet músicas, pregações e estudos bíblicos que interpretam assim a expressão “desejo de Deus”.

Tome cuidado. Seja como os “crentes de Bereia”. Examine com cuidado o que as pessoas dizem e permaneça fiel ao ensino das Escrituras Sagradas.