“Nem tudo que se pede depende da decisão de quem pede, mas depende do arbítrio de quem dá; assim, o ser humano nada reivindica para si sem a anuência também da decisão divina”.
A frase acima é de Cipriano de Cártago, um mártir que foi decapitado no ano 258 d.C. por causa da sua fé em Cristo. Suas palavras reforçam o entendimento, muitas vezes hoje esquecido, de que não temos o poder de manipular a Deus segundo nosso bom agrado. Porém, é isso que diversas pessoas desejam ardentemente: colocar a divindade a seu serviço.
“Nada têm, porque não pedem; pedem e não recebem, porque pedem mal, para esbanjarem em seus prazeres” (Tg 4.3).
O ser humano não é o ponto de referência, o fundamento, o ponto fixo quando se trata da sua relação com Deus. Este sim é o referencial. Nós orbitamos em torno de Deus e não ele do nosso. O Catecismo Maior de Westminster, símbolo de fé da IPB, um tratado doutrinário reformado calvinista do séc. 17, estritamente teocêntrico e cristocêntrico, inicia assim:
“Qual é o fim supremo e principal do homem? O fim supremo e principal do homem é glorificar a Deus e nele ter prazer para sempre” (CMW – pergunta 1).
Parece categórico que o egocentrismo impera no ser humano pecador. Fácil observar como seu desejo é que tudo gire ao seu redor e que esteja a seu serviço. Pessoas egocêntricas podem chegar ao cúmulo da pretensão de colocar o próprio Deus, quem as criou, como subordinado a si mesmas. Desejariam fazer de Deus seu “gênio da lâmpada”.
Longe disso é o ensino das Escrituras. A ênfase bíblica sempre foi, e não deixará de ser, a humildade e quebrantamento do homem perante Deus. Ele é o Soberano, o Senhor (adonai em hebraico e kyrios em grego), isto é, quem governa e é dono de todas as coisas. Por isso disse Paulo:
“Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre. Amém!” (Rm 11.36).
Não há poder humano, seja de qual espécie for, que possa subordinar Deus à vontade terrestre. Pelo contrário, nada há que possa impedir que a Vontade de Deus se cumpra e se imponha sobre todas as demais.
Na oração, como isso se aplica? Somos incentivados a súplica pela oração, colando perante Deus nossos pedidos – que privilégio – e sempre somos atendidos por Deus.
– Então Deus me dará tudo o que eu pedir?
Claro que não! Como pais humanos não atendem em tudo aos pedidos de seus filhos com um “sim”, dizendo-lhes “não” quando é o melhor para eles, do mesmo modo Deus, que nos trata como filhos, atende com “sim” ou “não”, que, vindo dele, será o melhor para nós. Por isso devemos sempre subordinar nossos pedidos a Deus à sua vontade. Foi o que disse João:
“E esta é a confiança que temos para com ele: que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, ele nos ouve” (1 Jo 5.14).
Outro ponto importante, além da subordinação do nosso pedido à vontade de Deus, é o que trata do nosso reconhecimento da sua graça generosa em nos atender as orações, de modo a sermos agradecidos por tudo o que nos dá em sua resposta. É o seguinte entendimento: O que temos recebido é porque Deus nos deu, logo, a ele seja a glória e nossa gratidão.
Aprendamos com as palavras de Jó:
“Então Jó se levantou, rasgou o seu manto, rapou a cabeça, prostrou-se em terra e adorou. E disse: — Nu saí do ventre de minha mãe e nu voltarei. O Senhor o deu e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor! Em tudo isto Jó não pecou, nem atribuiu a Deus falta alguma” (1.20-22).
Bem como com Paulo:
“De fato, grande fonte de lucro é a piedade com o contentamento. Porque nada trouxemos para o mundo, nem coisa alguma podemos levar dele. Tendo sustento e com que nos vestir, estejamos contentes” (1 Tm 6.6-8).